Hoje não me sinto mais segura.
Já havia percebido isso, porém cada vez mais percebo a presença dessa insegurança que se faz total, desse medo nos mais pequenos detalhes e decisões diárias.
Senti uma vontade grande de escrever, pegar um caderno e escrever.
Mas aí me deu medo, e pensei : "- É melhor escrever no computador, salvar com senha, é mais seguro."
Imediatamente me veio a lembrança de um cara, um estranho, doente, puxando de minhas mãos um caderno, meu caderno, onde estavam escritas apenas coisas minhas, fragmentos, espelho de mim.
Lembro da ira e revolta com as quais me olhava, enquanto tentava arrancar à força aquela parte de mim, a qual achava ser também direito e propriedade sua, assim como eu era.
Até que eu, depois de lhe machucar com uma mordida e me sentir culpada - como uma ladra que, depois de roubar e muito correr, estava cansada e ofegante e decide devolver envergonhada o que roubou (naquela época, eu ainda não tinha notado que nunca havia roubado nada) - abri uma página e li, chorando, em voz alta para ele o meu segredo, aquilo que havia lutado tanto para esconder: minha miséria.
Todo mundo tem um pouco de miséria dentro de si, uns mais, outros menos...
Mas a verdade é que, depois disso, nunca mais lhe perdoei.
Me invadiu e violentou minha alma das mais diversas formas possíveis.
E, como a vítima que se apaixona por seu estuprador, lhe tinha tão grande ódio quanto lhe guardava amor.
Após dias como esse - e foram muitos, nunca mais senti que pudesse ter algo só meu, que pudesse ter alguma intimidade comigo mesma, parei de escrever.
Uma grande impotência nasceu dentro de mim e me fez abortar uma das coisas que eu tinha de mais lindas: minha sede de liberdade, em troca da ilusão de possuir e ser posse de outro alguém.
Bom, e agora?
Agora já posso fazer o caminho de volta para mim.
Algumas pessoas podem nos condicionar a certos hábitos e mesmo a certos medos.
Mas o que é essência, personalidade, o que é verdadeiro, não se muda,permanece, apesar de tudo.